2007-01-31

Porque o debate deve esclarecer

Na discussão que se tem gerado a propósito da liberalização da IVG até às 10 semanas de gestação, as partes em pleito têm enveredado por um caminho errado, a meu ver, porquanto, ocupam-se muito mais em tentar ridicularizar os argumentos que o lado oposto alega em vez de apresentarem os seus pontos de vista. Por isso, e porque penso que é preciso fixar termos de debate, deixo a lista de razões que me levam a apoiar a não despenalização do aborto:

1.- Com a fecundação do óvulo nasce uma nova vida. Não antes. Não depois. Esta vida que é indubitavelmente humana merece e precisa de protecção quer física, quer social, quer afectiva, quer jurídica.

2.- Existe um conjunto de princípios essenciais cuja violação a sociedade aceita que deva ser criminalizada. Entre os quais está, sem qualquer sombra de dúvida, a liquidação de uma vida por outrém. É consensual que este tipo de comportamentos não é deixado ao arbítrio dos agentes. Ninguém aceitaria um homicídio ditado pela consciência individual do executante. Aliás, isso conduziria, inevitavelmente, ao caos social.

3.- A despenalização do aborto é uma lei contra o nosso tempo. E principalmente contra o nosso futuro. Os últimos anos têm demonstrado um vontade, quase unânime, de alargamento da protecção da vida. Hoje em dia, os atentados à existência humana (e até à animal e vegetal) são motivo de comoção geral. O caminho parece ser a cada vez maior preocupação em assegurar condições de segurança para o normal desenvolver e desenrolar da vida.

4.- Não há nenhuma situação da vida que obrigue a mulher a abortar. A mulher, numa gravidez indesejável, pode concluir que a sua vida seria bem menos gravosa e penosa se tal não tivesse ocorrido. Só que tal facto não justifica a execução sumária e sem agravo de um ser (que nem se pode defender). O legítimo direito à felicidade não pode aumentar exponencialmente no sentido de anarquicamente se sobrepôr ao direito à felicidade de outros. As pessoas não devem sofrer, mas também não podem, por essa razão, fazer sofrer muito mais os outros. E no caso vertente, não é, de forma alguma, líquido que a mulher vá sofrer menos com o aborto. As sequelas emocionais da IVG são em muitos casos trágicas.

5.- A gravidez que ora se discute resulta de um acto voluntário e consensual. Ninguém pode, licitamente, obrigar uma mulher a engravidar. A responsabilização pelos nossos actos é uma condição da vida em comunidade de forma a excluir a impunidade e o facilitismo. Todos os comportamentos sociais que geram consequências noutrém (neste caso geram outrém) têm de ser devidamente assumidos. A negligência não é razão para a irresponsabilidade.

6.- Não se resolve um problema através da permissividade da suas consequências nocivas. O problema em discussão, ao contrário do geralmente assumido não é o aborto, mas sim a gravidez indesejada. É aqui que a sociedade deveria intervir para atenuar a ocorrência dessas situações. E caso as medidas preventivas falhem, a comunidade deveria procurar apoiar e auxiliar a mulher na prossecução desse embaraço. Esta, sim é a forma de combater o aborto.

2007-01-29

Resposta aos argumentos de Ruy Caldas

Ruy Caldas apresentou num post abaixo vários argumentos bastante correctos, os quais passo a rebater.

1) É verdade que existem hoje vários métodos contraceptivos, mas todos esses métodos falham. Suponha-se uma mulher que tem trinta anos de fertilidade, durante os quais tem uma relação sexual por semana.
Faz 30 x 52 = 1560 relações sexuais. Suponha-se que, dessas relações sexuais todas, apenas 1/8 acertam no período fértil da mulher: faz 1560 / 8 = 195 relações sexuais certeiras. Suponha-se que essa mulher confia na pílula como método contraceptivo. A pílula tem uma eficácia teórica de 99,5%. Quer isto dizer que em 0,5% = 1/200 dos casos falha. Obtemos assim que a mulher acima descrita irá ter, com boa probabilidade e em média, uma gravidez indesejada!

Isto é um caso ideal, claro. Na prática, às falhas da pílula há que acrescentar falhas humanas (a mulher esquece-se de tomar a pílula) e falhas ocasionais (diarreias, interacções com outros medicamentos, etc, que podem eliminar o efeito da pílula).

Obtemos assim que há uma probabilidade razoavelmente alta de que um casal, mesmo usando contraceptivos com todo o cuidado exigível, acabe por obter uma gravidez indesejada.

É por isso que, se se quer ter um eficaz controle de nascimentos, tem sempre que se tolerar o aborto como solução de recurso.

2) É verdade que a despenalização do aborto é uma solução facilitista.
A mulher não tem que apresentar quaisquer razões para abortar, e pode decidir fazê-lo por motivos (na minha opinião) perfeitamente fúteis.
Mas não há outra forma razoável de garantir que a mulher obtenha o direito de controlar a sua fecundidade. De facto, proibir o aborto, como na lei actual, também é uma solução facilitista - a mulher é proibida de abortar, mesmo que tenha excelentes razões para o fazer!
A solução ideal, que seria ter um "tribunal" de pessoas muito razoáveis, que perguntassem à mulher quais as razões pela qual ela desejava abortar e lhe permitissem, ou não, levar o aborto a cabo, é uma solução inviável - quem seriam os "juízes" desse tribunal? Qual de nós se sente capaz de decidir sobre a vida de outra pessoa? Quem de nós é "Deus" e se arroga o direito de decidir se a uma mulher deve ser facultado ou proibido o aborto?

Sendo a solução ideal inviável, só resta uma das soluções facilitistas.
A solução em que à mulher é permitido julgar se pode ou não levar a gravidez a termo é a melhor, pois permite que haja pelo menos um ser supostamente racional - a mulher - a decidir, em vez de se ir por uma solução cega, como o é a proibição total de abortar.

3) Porque é que se põe um limite artificial ao aborto nas dez semanas de gravidez, e não nas 20 ou 30 ou 40? Basicamente, porque em toda a lei tem que haver um compromisso razoável. Porque é que nas auto-estradas é proibido circular a mais de 120 à hora, em vez de o limite ser 100, ou 140, ou 200? Porque é que o limite de álcool no sangue para a condução é de 0,8 g/l, em vez de ser 0,2, ou 1,0, ou 2,5? A resposta é sempre a mesma: tem que haver um compromisso. Embora seja muito perigoso conduzir numa auto-estrada, ou conduzir sob o efeito do álcool, isso não é proibido - apenas se impõem limites. Os limites são mais ou menos artificiais, mas são necessários.

No caso vertente, o sistema nervoso central do feto forma-se já depois das 10 semanas. Às 10 semanas, o feto é um ser sem sistema nervoso, sem sensações de dôr nem qualquer consciência de si mesmo. Matá-lo nessa idade parece pois menos irrazoável do que fazê-lo às 20 ou 30 semanas.

Luís Lavoura

2007-01-27

Comentário ao texto de Luís Lavoura

Luís,

Antes de mais, quero deixar desde já claro que vou votar sim no referendo. É neste único ponto que as nossas posições se tocam.

O planeamento familiar é não só um direito mas antes uma obrigação de qualquer pessoa.

O simples facto de as pessoas exigirem um direito não lho confere nem o torna subitamente legítimo. Adorava poder exigir o direito de não pagar impostos ou de mandar fuzilar pessoas que não fossem do meu clube. Por enquanto, limito-me a apresentar todas as deduções à colecta que sejam admissíveis e a festejar as vitórias do Porto.

Vai-me desculpar a franqueza, mas considerar o aborto como planeamento familiar é grave, para não usar um termo indelicado. Planeamento, por definição implica decisões tomadas a priori, com consequências previstas ou previsíveis. Ora se está a prever abortar, significa que sabe que se vai verificar uma gravidez indesejada. Ora se sabe que se vai verificar essa gravidez, tinha mais era que a evitar. Isso é que é o verdadeiro planeamento familiar! Quando a pílula, o preservativo, o DIU ou outros métodos falham, existe sempre a pílula do dia seguinte. Esta pobre, tão contestada, já resolve muita coisa. Agora, cair no erro de presumir que nem precisa de se preocupar porque o aborto vai ser permitido, isso sim, é criminoso.

Para mim, o aborto é errado. Considero que a partir do momento da concepção existe um novo ser humano, real ou potencial. É uma questão de tempo. Este ponto é controverso, mas vejo a questão assim. Não quero com isto dar o dito pelo não dito. Mantenho que vou votar pelo sim. Não consigo conceber uma lei que seja suficientemente abrangente para abarcar todas as circunstâncias em que uma pessoa decide terminar uma gravidez. Como se trata de uma decisão eminentemente íntima e pessoal, não vejo maneira de o legislador conseguir prever todas as possibilidades. Por esse único motivo vou votar no sim. Espero nunca me ver numa situação em que tenha de participar numa decisão de abortar ou não, mas espero que haja o bom senso de não me tirarem essa alternativa. O aborto, per se, constitui uma violência enorme sobre quem compreende o valor de uma vida. Não preciso de mais uma violência para quem já se sujeitou a terminar uma gravidez. O ABORTO NÃO É PLANEAMENTO FAMILIAR!

Da mesma forma, independentemente de uma lei ser cumprida ou não, após a publicação e o período de vacatio legis em que a população toma conhecimento da mesma, a dita lei está em vigor e tem de ser cumprida. Para assegurar isso mesmo, existem as forças policiais e os tribunais. Nem sequer é relevante se concordo ou não com a lei que está em vigor. Se a violar e for apanhado, sujeito-me à punição prevista.

A contracepção faz parte do planeamento familiar, que por suas vez integra a educação sexual. Se as pessoas tiverem informação e acesso às opções, vai haver menos gravidezes indesejadas. Não acredito que terminem, por causa do comportamento irresponsável típico da adolescência, mas estou convicto da redução.

Tiago Mergulhão

Enviado por um amigo

Novo Post

Recebi por email o texto que antecede. Apesar de estar devidamente assinado, incluía a solicitação para que o seu nome não fosse divulgado. O título é da minha autoria.

Mais uma acha

Há qualquer coisa de errado neste debate sobre o aborto. Não compreendo a relutância do lado do sim em discutir factos científicos. Não compreendo a relutância do sim em apresentar soluções para prevenir o problema. Não compreendo o interesse do sim em discutir questões filosóficas vazias de sentido que pela sua exposição, motivação e objectivos mais não são que verdadeiros sofismas. Aliás, sempre acreditei que, não sendo esta uma verdadeira discussão religiosa ou partidária, estaríamos perante um assunto que deveria aproximar campos normalmente opostos. Sempre pensei que quem tão veemente procura fazer crer que defende intransigentemente o fraco contra o forte, se interessasse pelo mais indefeso dos seres. Sempre pensei que quem tão veementemente procura fazer crer que possui uma ética superior se interessasse pelo valor fundamental para o seres humanos: a vida. Sempre pensei que quem tão veementemente procura fazer crer que está do lado do progresso e da evolução se interessasse pelo via que (basta parar e meditar sincera e honestamente) representa o verdadeiro futuro: a protecção de toda a espécie de vida e em fases cada vez mais precoces. Não compreendo a motivação do sim. Não compreendo essa obsessão em liberalizar sem qualquer critério nem restrição. Não compreendo a defesa que alguém só por ser mulher tem direito à impunidade. Aliás, parece-me que aqui reside o fulcro da questão. A mulher, e apesar do caminho que tem sido seguido para se obter a igualdade humana de direitos, tende a ser um alvo maior da compaixão e a obter dessa forma mais compreensão e indulgência. A tese associada é a mesma que permite pensar-se em quotas e quejandos. Não é justo para os homens e acima de tudo não é justo para as próprias mulheres. A mulher deveria poder afirmar-se por si própria e não por recurso à secretaria. O reconhecimento das suas qualidades deveria fazer-se pelo mérito e não por indulto. A sensação criada é a de um complexo generalizado de culpa por séculos de desvalorização (mais ou menos como se os judeus tivessem hoje o direito de mandar uns milhões de alemães para as câmaras de gás).

Homens e mulheres têm características físicas distintas. Uma delas é a capacidade das mulheres poderem engravidar. Esta possibilidade tem de ser assumida e compreendida para o bem e para o mal. Não é possível a mulher regozijar-se por poder ser mãe e depois cantar a ladainha da desgraça pelo mesmo facto. A gravidez é uma situação especial que requer atenções especiais. Por isso, não choca que se possa ajudar a mulher nessa situação ou a preveni-la quando a não deseja. Isso seria o caminho. Mas, como parece óbvio, essa não é a escolha do sim.

Texto assinado

2007-01-26

Não, Convictamente NÃO!

Porque é que digo convictamente “não” à liberalização do aborto?

1. Considero o aborto uma questão de vida e de morte; é um acto que contende com a vida e que, por isso, me obriga a ter esta posição. A nossa Constituição reconhece, no seu artigo 24.º, o carácter inviolável da vida. De facto, não consigo ler nesta disposição que a vida humana só é inviolável depois do nascimento. Mas não pensem que esta é uma posição isolada… Na verdade, dois dos mais reconhecidos constitucionalistas portugueses, Gomes Canotilho e Vital Moreira, escreveram a propósito deste princípio que, «enquanto bem ou valor constitucionalmente protegido, o conceito constitucional de vida humana parece abranger não apenas a vida das pessoas, mas também a vida pré-natal, ainda não investida numa pessoa, a vida intra-uterina». Perante isto, será que a vida antes do nascimento não merece idêntica dignidade e tratamento que a vida pós-nascimento?
Mais, esta disposição não visa apenas proteger o direito à vida, mas também, e claramente, o direito a nascer. Permitir a prática do aborto seria, de certa forma, ser conivente com «a ditadura dos já nascidos sobre o destino dos que por esses são condenados a morrer antes de terem nascido», como alguém já escreveu.

2. Então, o aborto é crime? Obviamente que sim! Se o nascituro constitui uma vida, não seria sensato retirar ao aborto a classificação de “crime”, na medida em que se trata de um acto contra vida, que terá como consequência a aplicação de uma sanção penal, como se verifica em relação a todos os outros actos deste género. No entanto, podem existir circunstâncias concretas que atenuem ou cheguem mesmo a obstar à aplicação de uma qualquer pena à mulher.

3. Como há tempos afirmou Miguel Sousa Tavares, «o ridículo causa danos.» O aborto não tem nada a ver com as verborreias com que, por vezes, somos confrontados nas ruas, nos jornais ou televisões: “ sim ao direito à minha barriga” “sim ao direito a dispor do meu corpo”… no mínimo RIDÍCULO! Caro leitor, o aborto não é um direito. O aborto é um atentado contra um direito natural: a vida.

4. Defender a despenalização porque o aborto é frequentemente praticado não é um argumento válido. Desde há séculos que se rouba; será que o acto de roubar também deverá ser despenalizado? E o homicídio? Já agora questiono: estando em causa abortos clandestinos, como se pode precisar com tanta exactidão o seu número? No mínimo estranho e susceptível de não constituir facto credível…

5. Algo indignante é todo o oportunismo político que se tem visto à volta deste problema. Alguns partidos fazem, inclusive, do aborto uma bandeira política. Não façamos dele uma questão política! Só as marionetas que, infelizmente ainda abundam, entendem que esta é uma questão partidária e, como “ovelhinhas”, votarão a favor da despenalização/liberalização somente porque pertencem a um determinado partido… Ainda a propósito, chamo a atenção para a posição do Partido Ecologista “Os Verdes” que, segundo li recentemente num jornal do Minho, apoiará o “sim” neste referendo; subscrevendo, D. António Marto, Bispo de Leiria-Fátima, deixo a questão: «Porque é que as leis humanas parecem interessar-se mais pela protecção de certas espécies vegetais (como o cortar de determinada árvore) ou animais (como os ovos de cegonha) do que com a do ser humano em embrião ou feto?»

6. Basta de eufemismos! Chamar ao aborto interrupção voluntária da gravidez, ou mesmo IVG, é suavizar, esconder uma realidade, um acto que até os próprios partidários do sim querem relativizar… A própria questão a que os portugueses serão chamados a responder a 11 de Fevereiro é enganadora! O que se pergunta neste referendo, é se os portugueses querem ou não a liberalização do aborto até às 10 semanas uma vez que, com a vitória do “sim”, as mulheres irão adquirir um verdadeiro “direito de aborto”, em estabelecimento de saúde autorizado, público ou privado.
7. Por tudo isto, e muito mais, dia 11 de Fevereiro votarei convictamente "NÃO"!

Sónia Monteiro
www.filtragens.blogspot.com

Duas razões para o voto Sim

Há basicamente duas razões para se despenalizar o aborto.


A primeira razão é que temos que reconhecer o direito ao planeamento familiar, isto é, ao controle dos nascimentos. Independentemente de gostarmos ou não desse direito, ele é exigido por grande parte das pessoas - e, se as pessoas EXIGEM ter esse direito, numa sociedade democrática, ele tem que ser concedido. As pessoas querem controlar a sua fertilidade, querem ter filhos quando lhes convém e só aqueles que lhes convém.


Ora, o aborto é uma NECESSIDADE para um planeamento familiar eficaz, porque todos os métodos contraceptivos falham. Falhas técnicas ou falhas humanas, não importa: o que é certo é que falham. As pessoas não admitem, não podem admitir, que o seu planeamento familiar vá por água abaixo devido a uma falha - porque a mulher se esqueceu de tomar a pílula um só dia, porque o preservativo se rompeu, porque a mulher teve uma diarreia depois de ter tomado a pílula, etc.


A contracepção e a educação sexual NÃO SÃO substitutos do aborto. Mesmo em sociedades muito evoluídas e civilizadas, como a holandesa ou a alemã ou a sueca, nas quais as pessoas têm muita educação sexual e praticam generalizadamente a contracepção, continua a haver imensas gravidezes indesejadas. Portanto, a possibilidade de abortar é sempre necessária, como solução de último recurso. É espúrio pensar que, mediante uma intensificação da educação sexual, o aborto se tornará desnecessário. Isso nunca se verificou em nenhuma sociedade.


A segunda razão é que não há nenhuma razão clara, numa perspectiva liberal, que é a minha, para que o aborto seja um crime.


Há duas razões para os crimes que são reconhecidos no código penal de uma sociedade. Uma razão, a mais frequente, é preservar o bom funcionamento da sociedade. É por isso que, em geral em todas as sociedades, o homicídio ou o roubo são considerados crimes. Outra razão, muito menos frequente, é um simples código moral, a preservação de certos costumes da sociedade. É por isso que, em certos países, é proibido servir carne de cão nos restaurantes, ou é proibido vender casacos feitos com pele de gato, ou é proibido tourear touros, ou é proibido abortar. No caso destas leis, não há qualquer prejuízo social óbvio na sua eliminação - a sociedade não entra no caos e na insegurança se as pessoas comerem carne de cão, usarem peles de gato, fizerem touradas, ou abortarem. Trata-se apenas de codificar como crimes certas práticas que a grande maioria das pessoas na sociedade considera moralmente repugnantes.


Esta segunda razão é muito frágil, pois que se apoia apenas no julgamento moral da maioria. Numa sociedade liberal, as maiorias devem ser postas em causa. Através da imigração ou da evolução social, as mentalidades mudam e os julgamentos morais também. Proibir coisas apenas porque uma maioria das pessoas as considera moralmente repugnantes é, em geral, uma atitude pouco liberal. As minorias têm o direito de ter as suas práticas e os seus gostos, e de agir de acordo com eles. Mesmo numa sociedade em que a maioria das pessoas considera repugnante fazer sofrer os animais, haverá pessoas que gostarão de fazer touradas ou de assistir a lutas de cães - e essas pessoas têm o direito de fazer isso. O facto de serem uma minoria não lhes retira o direito.

No caso do aborto, a questão é ainda mais dramática, uma vez que não há na nossa sociedade uma maioria expressiva de pessoas que o condene. Como se vê pelas estatísticas da sua prática, e pela generalizada cumplicidade existente - quase todas as mulheres ou já praticaram aborto, ou conhecem e ajudaram activamente quem já o tenha praticado - não há na nossa sociedade uma rejeição moral maioritária do aborto. As pessoas não falam do assunto - mas, se forem confrontadas com ele, não o acusam, nem estigmatizam a mulher que abortou. Há compreensão pelo fenómeno. Nestas condições, manter uma lei que condena o aborto apenas por motivos morais, não faz qualquer sentido.

Luís Lavoura

2007-01-25

A questão do aborto não se poderá colocar hoje, no século XXI, do mesmo modo que se colocava há alguns anos ou décadas atrás. Existem hoje dos mais acessíveis e variados métodos anticonceptivos; existe até a pílula do dia seguinte. São métodos baratos, eficazes e amplamente divulgados.

Por razões humanistas, no seu sentido mais lato, não considero muito ético o facilitismo com que os defensores do aborto tratam o tema. Aceito como razoável que as sociedades comunistas do princípio do século XX, como as antigas repúblicas soviéticas, de uma racionalidade mecanicista e sem grandes meios, “resolvessem” questões como o aborto, assim, com esta facilidade. Nos tempos actuais, este facilitismo de resolver dificuldades parece-me anacrónico e eticamente reprovável.

Dizem-nos, somos um dos últimos países europeus a não ter uma lei do aborto mais permissiva. Mas que Europa? A Europa dos monopólios que segundo os dados da própria Comissão europeia nos revelam que“a parcela de riqueza que é destinada aos salários é actualmente a mais baixa desde, pelo menos, 1960 (o primeiro ano com dados conhecidos). Em contrapartida, a riqueza que se traduz em lucros, que remuneram os detentores do capital, é cada vez mais alta.”
Será com os “exemplos” desta Europa que nos querem convencer da bondade da proposta da nova lei do aborto?

Por outro lado, não se entende que os argumentos dos defensores do sim, se restrinjam às 10 ou 12 semanas. Os argumentos são do mesmo modo válidos para as vinte, trinta ou quarenta semanas. O ser gerado no ventre da mãe não oferece nenhuma alteração qualitativa, nenhuma salto qualitativo no seu desenvolvimento contínuo que permita estabelecer diferenças, datas ou prazos para o aborto.
É uma assunção mecanicista, quanto a mim, muito pouco evoluída.

Este equívoco e esta contradição, retira quanto a nós, toda a força de argumentos aos partidários do sim. Os exemplos dos países comunistas são válidos porque à luz da evolução tecnológica de então seria "aceitável" uma tal solução. Manter soluções iguais, hoje, parece-me uma atitude retrógrada perante o problema. Parecendo progressista, o sim ao aborto, traduz hoje, uma posição conservadora perante a vida e a sociedade, fruto de um racionalismo mecanicista e economicista.

Não tenho nenhuma "irritação" quanto aos partidários do sim. Move-lhes a vontade de solucionar este problema social. Só que a “solução” preconizada não será aceitável no actual estágio da evolução humana, no estágio dos direitos humanos alcançados já pela humanidade.

www.classepolitica.blogspot.com

2007-01-23

Pedido

Porque o objectivo do blogue não era ser exclusivamente mais uma via para a defesa do NÃO, porque se desejou que se tornasse num espaço de discussão honesta e elevada, com a representação das várias perspectivas acerca do referendo sobre a IVG, gostaria imenso de receber a participação de outras ideias e convicções. Ajudem-me a esclarecer o debate. Obrigado.

Razões de um voto - 4

De tudo o que tenho lido impressiona-me, sobremaneira, aquele argumento que diz que a gravidez da mulher não é mais que uma questão da sua intimidade, pelo que só ela pode decidir sobre o seu futuro (aliás já cheguei a ler declarações de pessoas de relevância nacional no sentido de apenas ser concedida autorização para votar às eleitoras em referendo sobre o aborto). A sociedade, o estado e a lei reconhecem à mulher determinado tipo de privilégios quando se encontra grávida. Estas prerrogativas nunca foram postas em causa ou se o foram a polémica visava o alargamento de benefícios e não a sua redução. Ou seja, a mulher sempre aceitou partilhar com a comunidade a responsabilidade de estar grávida em troca de auxílio e compreensão, pelo que me parece, no mínimo desleal, o argumento reproduzido. Para melhor se entender a ideia, imaginem uma mulher grávida a chegar ao hospital para ser consultada, examinada ou até para dar à luz e receber como resposta a recusa de auxílio porque aquele não era um problema do hospital, outrossim uma questão da sua intimidade que ela sozinha deveria resolver. Mais, durante a gravidez torna-se extremamente vantajoso que o pai acompanhe a mãe não só com o seu auxílio e presença como também com apoio financeiro quando este é necessário. Poderão os pais neste caso eximirem-se a tal obrigação com o argumento de que é um problema da exclusividade da mulher? É que não é raro tal acontecer e é reconhecida a censura que se efectua (e bem) em tais situações. Tenho para mim que até por aqui, para não voltar a referir que está em causa uma nova vida, a gravidez não é um problema da intimidade da mulher, da sua exclusividade ou da sua consciência.

Razões de um voto - 3

Os grandes argumentos a favor da liberalização da IVG até às 10 semanas, pelo menos os que são publicamente assumidos, fundam-se em duas alegações: uma, aquela que aponta a injustiça da prisão da mulher que aborta, outra, o enorme número de mulheres que arriscam a vida por serem "obrigadas" a recorrer ao aborto clandestino. A primeira traduz, na prática, uma falácia, porque não há qualquer mulher presa em Portugal (segundo os dados que são públicos) por ter praticado a IVG. De qualquer maneira, e por princípio ético, não seguirei esta via porque a situação exposta não representa o que eu penso. Correndo o enorme risco de me repetir, tenho para mim que o aborto constitui um crime tanto mais hediondo quanto o facto de a vítima ser um dos seres mais indefesos que podemos imaginar. E como crime que é, não tenho qualquer dúvida que deve ser devidamente penalizado e quer a mulher que o praticou quer qualquer pessoa que a tenha auxiliado (incluindo o pai do feto) cominados consequentemente. Não entendo porque há-de a mulher, só pela razão do seu género, ser moral e socialmente absolvida quando pratica um crime. O facto de ser mulher não iliba nem desculpa práticas e comportamentos que devam ser pela sociedade reprovados. No fundo, a despenalização da IVG tem por fundamento as mesmas premissas da lei das quotas, só que aplicadas numa situação exponencialmente mais trágica.
Quanto à segunda ordem de razões, o argumento invocado pressupõe uma premissa falsa: nenhuma mulher é obrigada a abortar (excluindo a possibilidade de ser por outrém a tal coagida, ocorrência que integrará outra tipificação criminal e que se não insere nesta discussão). Nenhuma situação da vida obrigará, de forma absoluta, a mulher a abortar. Quanto muito, a mulher poderá concluir que a sua vida seria substancialmente menos penosa se não tivesse engravidado. Mas tal facto não deve nem pode colocar a mulher numa situação em que não tem outra opção se não abortar. Aliás, melhor faria o estado se em vez de seguir o caminho mais fácil, que no caso é o mais horrendo, criasse as condições para que em primeiro lugar a mulher estivesse devidamente preparada para evitar a gravidez indesejada e em segundo lugar a mulher grávida fosse apoiada, estimulada e acarinhada na prossecução da sua gravidez. Depois, duvido muito do "facto" de ser avassalador o número de mulheres que entram nas urgências em perigo de vida devido a um aborto ("facto" que apesar de não ter tradução em números por qualquer estudo é bovinamente aceite como verdadeiro). As técnicas para efectuar um aborto (tanto quanto se pode perceber da variadíssima informação que circula) são bem mais inócuas que aquelas que eram utilizadas há algumas dezenas de anos. Uma mulher que queira abortar tem à sua disposição um sem número de fármacos que a podem ajudar na concretização desse objectivo e cujos efeitos secundários não atingem as proporções que nos pretendem fazer crer (não quero, obviamente, com isto fazer a apologia de uma prática que considero profundamente vil, mas apenas demonstrar a fragilidade do argumentado). O que já não é tão inócuo são as consequências psíquicas e emocionais da realização de um aborto. O sentimento de culpa, a enorme tristeza e os remorsos que as mulheres experimentam (nem todas, obviamente) depois de efectuarem um aborto são consequências que perdurarão para o resto da vida. E esta é uma realidade que nem o SNS nem a mais luxuosa das clínicas privadas conseguirão mitigar.

2007-01-20

Mais uma vez os portugueses são convocados a um referendo para alargar a despenalização do aborto. Já temos em Portugal, desde 1984, uma lei que não penaliza o aborto nos seguintes prazos e circunstâncias: até às 12 semanas de gravidez, se houver perigo de morte ou grave lesão para o corpo e a saúde da mulher; até às 24 semanas, quando for previsível que a criança venha a sofrer de grave doença ou malformação congénita, incuráveis; até às 16 semanas, em caso de ofensas sexuais como violação ou incesto; sem prazo limite, se for o único meio de remover perigo de morte ou de irreversível lesão para o corpo e a saúde da mulher.


Em 28 de Junho de 1998 a pergunta posta a referendo foi esta, e será a mesma no próximo dia 11 de Fevereiro:
“Concorda com a despenalização da interrupção voluntária da gravidez, se realizada por opção da mulher nas primeiras 10 semanas, em estabelecimento de saúde legalmente autorizado?”
A resposta maioritária foi NÃO. Mas, logo na noite dos resultados, alguns políticos prometeram que voltariam a repor o assunto. Esta promessa não a deixaram eles por cumprir. Em Abril de 2005 a Assembleia da República aprovou um projecto de lei que despenaliza a interrupção da gravidez “a pedido da mulher”, até às 10 semanas. Mas não só. Nesse mesmo projecto de lei aprovado, a que o próximo referendo se reporta, há uma alínea que alarga a despenalização, “por razões de ordem económica e social”, - até às 16 semanas. Contudo, a pergunta que irá ser apresentada a referendo fala apenas do caso “a pedido” ou “por opção” da mulher, até às 10 semanas. Se o “sim” for maioritário e o projecto de lei aprovado se transformar sem alterações em lei da República, isto significa o seguinte: Que os cidadãos irão votar as 10 semanas mas – sem o saberem – também estarão a autorizar as 16 semanas “por razões de natureza económica ou social”… Como estas “razões” também, evidentemente, não excluem o “pedido” e a “opção”, a liberalização do aborto pode vir a estender-se na prática até às 16 semanas, prazo que se mantém nos casos de violação.
O que é que sucedeu na realidade do mundo nestes quase nove anos de intervalo que justifique alterar a lei actual e permitir o aborto “a pedido” ou por mera “opção”? Não se sabe. O que se sabe é que, já desde Maio de 2002, a mesma Assembleia da República aprovou que se encomendasse a realização de um estudo cientificamente credível sobre a situação do aborto clandestino; sabe-se que até hoje o estudo continua por fazer, mas que no orçamento da Assembleia para 2007 ainda há provisão de verba para tal estudo… Isto é: primeiro aprovam-se leis e fazem-se referendos, depois encomendam-se estudos! Sabe-se também dos números sobre abortos clandestinos divulgados por grupos e instituições interessadas na despenalização do aborto, como sejam clínicas privadas estrangeiras que neste momento têm já no ministério da Saúde pedidos de autorização para operarem no nosso país. E o que mais se sabe é o mesmo que sempre se soube. Que há uma realidade clandestina feita de conhecimentos pessoais, apartamentos privados e de um segredo cúmplice que interessa a todas as partes envolvidas manter o mais possível. Que há situações pessoais muito dolorosas em que as mulheres se encontram, às vezes ainda jovens de menor idade, abandonadas ou ameaçadas por companheiros e familiares próximos. Que há violações e relações incestuosas, situações de tal modo chocantes que à primeira vista são sentidas como insuportáveis ou desesperadas. Mas também, quantas vezes, apenas leviana inconsciência, insensibilidade moral e comodismo egoísta. Compreende-se que se pense fazer e se façam abortos. Tudo isso se sabe, como também se sabe que os contraceptivos se encontram disponíveis e baratos por toda a parte, e que para casos de imprevista necessidade ou mero “descuido” as “pílulas do dia seguinte” são acessíveis gratuitamente nos centros de saúde, hospitais ou farmácias, até sem receita médica.
Mas as situações más da vida não tornam um bem aquilo que o aborto faz. Seja numa clínica privada, seja num hospital público ou seja numa casa particular (com menos segurança mas mais privacidade), aquilo que o aborto faz não é apenas “interrupção da gravidez”. O que está em questão neste referendo não é simplesmente tornar lícito que, “a pedido” ou “por opção”, a mulher possa interromper um problema apenas seu ou livrar-se de aborrecimentos e incómodos apenas seus. O que está em questão possibilita optar por interromper uma vida que não é dela.
Nenhum cientista e nenhum médico honestos podem negar aquilo que hoje as ecografias puseram à vista de todos os que não queiram ver apenas os seus problemas: às 10 semanas, como desde a primeira hora, está vivo um novo ser humano, que não é nenhuma parte do corpo da mulher que o traz em si. Há um novo ser humano vivo que pesa cerca de 15 gramas, que tem cerca de 5 centímetros de comprimento, com músculos nos membros, no tronco e na face; tem olhos, orelhas, ouvidos, abre e fecha a boca; nas mãos, já tem as impressões digitais que conservará pelo resto da sua vida; o sistema cardiovascular já está desenvolvido e o pequeno coração bate cerca de 175 vezes por minuto. Está vivo e é em tudo semelhante ao que cada um de nós era quando tínhamos aquele tempo de vida. Portanto, por mais que custe ou não interesse a alguns encarar esta realidade, aquilo que o aborto faz é matar a vida de um novo ser humano, e que não tem culpa nenhuma das situações aborrecidas em que os outros se metem ou são metidos. Mais: não apenas sem culpa, mas completamente indefeso e à mercê do que os outros lhe queiram fazer. E não tenhamos medo de chamar a realidade nua e crua pelo seu nome: agir alguém de maneira a procurar matar a vida de um ser humano chama-se homicídio. É este o preço que custa o garantir antes do mais e acima de tudo os direitos da mulher à “autodeterminação sexual” e à “maternidade consciente”, como se ela não tivesse autodeterminação e consciência antes de ter relações sexuais; como se os seus companheiros e familiares próximos não existissem; como se houvesse algum direito a dispor da sua vontade sem o dever de respeitar a vida de outros, cujo único “mal” é existirem sem culpa nenhuma disso.
Se o aborto implica a morte de um ser humano indefeso e que não ameaça a vida de ninguém, é racionalmente compreensível e moralmente exigível que o Estado e a Lei não se demitam do dever de defender por todos os meios legítimos as vidas de todos nós, e primeiro que tudo as vidas dos menos culpados e mais indefesos. O Estado, os governos, os tribunais e a polícia existem e justificam-se precisamente para assegurarem esse direito básico a viver a sua vida quem não faz mal nenhum. O que não há é direito ou razão nenhuma médica, social ou moral para defender a despenalização do aborto a pedido até às 10 semanas e depois criminalizá-lo às 11, 12 ou mais semanas. Portanto, se vencer o “sim” no referendo e a nova lei for cumprida, nem por isso as mulheres deixarão de poder ser acusadas e julgadas em tribunal. Mas se por simples “pedido” ou mera “opção” o aborto for liberalizado, o certo é que aumentará o número de abortos legais; os clandestinos, que em nenhum país se demonstrou que tivessem diminuído, não desaparecerão porque sempre garantem maior segredo; e dá-se à sociedade a ideia de que o aborto pode ser mais um método contraceptivo “de emergência”, igual a outros, com menosprezo da vida humana inocente.

Concidadã / Concidadão:
É do teu interesse, é do interesse de todos nós, a defesa do direito fundamental à vida e o dever de a proteger. É do interesse de todos nós que a nossa sociedade seja menos injusta. Não podemos escandalizar-nos que as crianças, depois de nascerem, sejam vítimas de pedófilos, e não nos escandalizarmos que, antes de nascerem, sejam mortas. É do teu e do nosso maior interesse que o poder público do Estado esteja ao serviço dos mais fracos e não dos interesses e direitos dos mais fortes. Se o aborto é um homicídio, isso equivale a não penalizar o homicídio dos mais pequeninos e fracos dos seres humanos. Considera bem a situação em que hoje está a nossa sociedade portuguesa e o estado da justiça no nosso país. Não deixes, com a tua abstenção, que venham alargar os prazos e facilitem os casos em que se pode fazer o mal. Não penses que a lei não obriga ninguém a abortar. Não obriga, mas permite. A liberdade de abortar é licença para matar. Não deixes de lembrar aos mandantes políticos que ao menos tu ainda não toleras que a lei dos mais fortes triunfe sobre os mais fracos – e ainda não abdicaste de defender a JUSTIÇA.

PEDRO ISIDORO

2007-01-18

Razões de um voto - 2

Numa situação em que uma grávida deseje interromper esse embaraço, existem dois direitos em conflito: o primeiro relativo ao direito do feto a viver e o segundo referente ao direito da mulher em não suportar as consequências dessa gravidez. Acontece que o direito do feto será sempre mais relevante do que o direito da mãe. Em primeiro lugar porque estamos em face de um direito à vida que como direito primário e básico será, normalmente, mais importante que os outros direitos. Aliás, é meu entendimento que este direito só pode ser prejudicado por opção própria ou por estar em conflito com outro direito à vida. Em segundo lugar porque o direito da mulher nasce de um facto que ela voluntariamente criou (se não for esse o caso, já existe regulamentação aplicável e que não é agora discutida). Mesmo que apenas a título de negligência (que nosso ordenamento também é denominada "mera culpa"), os dois progenitores do feto são responsáveis pela sua concepção. E não percebo como é que alguém que voluntariamente se coloca na posição de ser responsável por uma vida pretende extinguir essa existência motivada pelo simples facto de tal vida não ser desejada. É certo que sabemos de muitas histórias de pessoas que viram a sua situação individual prejudicada por uma gravidez indesejada. No entanto, e manifestamente, a via que a sociedade deve adoptar não está na liquidação sumária e sem hipótese de agravo do feto de idade inferior a 10 semanas. Seria muito mais pertinente e infinitamente mais humano que se apostasse em soluções preventivas. Um pequeno exemplo entre muitos que se poderiam oferecer, são as verdadeiras fortunas que se gastam nas campanhas para evitar a propagação da sida através do acto sexual e que poderiam ser alargadas de forma a incluir a prevenção da gravidez indesejada? Aliás, e tentando estabelecer um nível mínimo de entendimento, sempre ouvi da parte dos defensores do sim que o aborto é sempre um mal menor. Ora se é um mal a sociedade não deve nem pode resolver uma situação negativa através da permissividade. Só pode encontrar a solução para o problema na tentativa de diminuição (até à extinção) da sua causa. Sinceramente, sendo certo que posso estar enganado, nunca ouvi um defensor do sim dizer que mesmo liberalizando o aborto se tentaria evitar que a mulher se colocasse na situação de "ter" que o fazer. O que certamente me poderia levar a outras conclusões.

2007-01-17

Razões de um voto - 1

Sem pretender ser dono da verdade e da razão, acredito militantemente que nasce uma vida com a fecundação. Não antes nem depois. E tenho para mim que essa vida, manifestamente humana, representa um ser indefeso que carece da nossa protecção. Não concebo, em geral, qualquer limite ao direito à vida senão as reservas que o próprio titular lhe queira atribuir. Ou seja, só por opção própria, poderá este direito ser restringido ou afastado. O direito à vida é, no meu entendimento, a base e a condição essencial para todos os outros direitos de que podemos ser titulares. Por isso e por estar em causa um ente indefeso sou fundamentalmente contra a despenalização da IVG. Acho que como qualquer atentado à vida deve ser objecto da grave reprovação da sociedade e como tal tipificado como crime. Aliás, acredito que o futuro aponta para a protecção da vida em fases cada vez mais precoces. Assim, não me choca, mais cedo ou mais tarde o feto será, e bem, legalmente defendido como são aqueles que já nasceram. Mas, ponto fulcral e inicial de discussão, acredito que com a união entre o espermatozóide e o óvulo se cria uma nova vida (obviamente humana). Não antes nem depois.

O porquê do blogue

Apesar da minha posição acerca da interrupção voluntária da gravidez não ser, de todo, descomprometida porquanto irei votar decidida e firmemente NÃO, decidi criar este espaço para promover um debate sério acerca do tema. Existem muitas pessoas com algo a dizer sobre a matéria, mas que não possuem qualquer canal para expor as suas opiniões. Comprometo-me, por isso, a publicar todos os textos de qualidade que me enviarem, sejam eles reflexo de posições a favor, contra ou sem opinião formada acerca da IVG. Além do exposto, são aceites todos e quaisquer comentários, solicitando-se, desde já, o mínimo de urbanidade para que a discussão se possa efectuar de forma civilizada. Tentarei gerir este espaço dentro da maior imparcialidade, o que obviamente não significa que os meus textos ou comentários deixem de ser motivados pela minha própria opinião. Sejam bem vindos.